segunda-feira, 25 de agosto de 2008

A monotonia da civilização do dinheiro


Argemiro Pertence 21 de agosto de 2008

Nada mais cansativo que viver a história de um tempo em que os mesmos fatos se repetem com uma freqüência irritante. Acabamos de assistir a invasão do Iraque pelos Estados Unidos, sob o pretexto de apreender de armas de destruição em massa e combate ao terrorismo. Sabemos todos hoje que nada disto é verdadeiro. A invasão ao Iraque deu-se por conta da necessidade, por parte dos EUA, de ter controle sobre as imensas reservas de petróleo disponíveis naquele país, bem como ameaçar o vizinho Irã, por sua recusa em se alinhar com o Ocidente, sendo este também, por coincidência, dono de reservas petrolíferas consideráveis.

O panorama do Oriente Médio, afora a invasão, é também monótono. A região que produz 25% do petróleo consumido no mundo prima pela existência de pseudo-estados, dirigidos por pseudo-governos e habitado por pseudo-cidadãos. A Arábia Saudita, os Emirados e o Kuwait transbordam em bilhões e bilhões de euros e dólares esbanjados por elites e realezas passivas ante os interesses das corporações globais do petróleo, totalmente sem compromisso com suas sociedades que vagam pelos areais das margens do Golfo Pérsico recolhendo migalhas que sobram dos banquetes monárquicos.

Não bastasse o tumulto causado ao povo iraquiano, os EUA prosseguem em sua monótona caminhada belicista na região. Após o desmembramento da União Soviética, nos anos 90 do século passado, ampliou-se bastante a atividade de proselitismo capitalista dos norte-americanos dirigida a países recém-formados, especialmente na região do Mar Cáspio. Uma das presas fáceis desta atividade foi a Geórgia, ex-república soviética, carente de infra-estrutura e politicamente frágil naquele momento.

Ocorre que a região em torno do Mar Cáspio foi também brindada com uma das mais formidáveis reservas de hidrocarbonetos do planeta. Sob suas águas – por vezes ultra-profundas, estima-se que haja em torno de 160 bilhões de barris a serem extraídos, o
suficiente para um longo período de prosperidade e muito mais do que o
necessário para reorganizar a dinâmica da geopolítica global.

Pois foi justamente nesta região que os EUA se envolveram, agora de forma mais evidente, ao armar, treinar e financiar as forças armadas georgianas e incentivar seu governo para um ataque à sua ex-província, a Ossétia do Sul, cuja autonomia em relação à Geórgia foi declarada em 1991, embora jamais reconhecida por esta.

Porém, que importância tem a Ossétia do Sul em todo este imbroglio? Em função da posição geográfica do Cáspio e de suas áreas produtoras, toda a produção dali deve escoar por dutos terrestres até algum porto marítimo de onde então seguiria para os mercados que o demandam. Uma das rotas mais viáveis, que já está projetada, é a que liga a região de Baku, no Azerbaijão até o porto de Ceihan, na Turquia – à beira do Mediterrâneo - é a que passa pela Ossétia do Sul e pela Geórgia. O controle da Ossétia do Sul pela Geórgia, apoiada pelos EUA, soou aos ouvidos dos dirigentes do Kremlin como uma provocação. Seria demais para os russos terem nas suas barbas a presença de títeres dos EUA dando as cartas sobre a exportação de petróleo do Cáspio e das regiões meridionais da própria Rússia para a Europa Ocidental.

Como os russos aceitam tacitamente o controle norte-americano no Golfo Pérsico, eles decidiram que não aceitariam algo similar junto à sua fronteira.

E a história se repete monotonamente...



sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Energia e injustiça



Argemiro Pertence
30-Jul-2008
A energia representa um dos fundamentos do Universo. Apesar de os físicos ainda desconhecerem seu processo de formação e estarem até hoje limitados às teorias pra explicar sua origem, um fato é incontestável: a formação do Universo envolveu a liberação de fantásticas quantidades de energia criadora, processo este que ainda se encontra em pleno andamento.

Nosso minúsculo sistema solar depende em muito da energia térmica e luminosa liberada por sua estrela central – o Sol – para a manutenção da vida e do meio ambiente em que vivemos. Fato relevante é que a energia solar é distribuída livremente a todos os recantos do sistema, respeitadas, evidentemente, as leis físicas. O intervalo de temperaturas prevalecente em nosso planeta, fruto da radiação solar incidente, é exatamente aquele que favorece as formas de vida que aqui existem. Afora isto, a energia solar tem hoje muito mais aplicações, como conseqüência do desenvolvimento tecnológico da humanidade.

Em sua definição mais simples, energia é o equivalente físico de trabalho. Desde a descoberta do fogo, como forma de geração de energia na pré-história, passando pelas ineficientes máquinas a vapor da Revolução Industrial, até os modernos reatores nucleares, a produção de trabalho tem sido o objetivo. A produção de energia para o acionamento de máquinas visou a execução de trabalho anteriormente executado pelo braço humano ou pela força animal. Esta mudança resultou no aumento da eficiência do trabalho e na liberação gradual do homem do trabalho braçal para que este se dedicasse, cada vez mais, ao trabalho intelectual criativo, trabalho este que propiciou a evolução da humanidade, estabelecendo-se, em razão disto, um círculo virtuoso de criatividade e progresso.

Com o passar do tempo e especialmente nos últimos dois séculos, entretanto, o uso de energia assumiu aspectos menos nobres. Com o advento do carvão mineral e, mais tarde, do petróleo e do gás natural, cresceu a concentração do controle das fontes de energia disponíveis e este domínio resultou no surgimento de conflitos, disputas e na exploração dos mais fracos.

Hoje, cerca de 40% da energia em escala global vem do petróleo e do gás natural, cujas fontes estão como nunca concentradas, tanto em termos geográficos como em termos de sua propriedade. O número de gigantescas corporações estatais e públicas que controlam mais de 90% da produção de petróleo e gás não ultrapassa uma dúzia. Não se deve, portanto, estranhar o absurdo nível de especulação que envolve os preços dessas “commodities”.

Apesar deste quadro, não há no horizonte qualquer vislumbre de alteração. As sociedades mais ricas sequer admitem rever seus padrões de consumo de petróleo objetivando reduzir sua demanda e, em consequência, seu preço, bem como diminuir o crescente impacto nocivo da queima de derivados de petróleo sobre a Natureza.

Por mais incrível que possa parecer, milhões de cidadãos norte-americanos têm por hábito ir à esquina de sua casa, comprar uma Aspirina ou uma Coca-Cola, ao volante de seus carrões, dotados de motores altamente ineficientes e não imagina viver sem esse tipo de “conforto”.

Ao lado disto e no mesmo mundo, bilhões de cidadãos asiáticos, africanos e latino-americanos não dispõem de energia nem de recursos para comprá-la para irrigar suas lavouras de subsistência. Em resumo, apesar de tudo, vale aqui lembrar que “o sol não nasce para todos”.