sexta-feira, 25 de maio de 2012

Hollande eleito – a França volta a ser rebelde

A França volta a ter um governo sob controle do Partido Socialista após 17 anos, desde François Mitterand, com a eleição de François Hollande. Mitterand enfrentou grandes dificuldades ao ter que lidar com a inauguração e o avanço do neoliberalismo, representados por Margareth Thatcher, na vizinha Grã Bretanha, e Ronald Reagan do outro lado do Atlântico, nos EUA.
François Hollande vai ter de enfrentar a crise da Europa que, segundo os líderes liberais do continente, sob a batuta da alemã Angela Merkel, será resolvida com corte de gastos públicos.
         Ora, corte de gastos públicos representa um duro golpe no Estado de Bem-estar Social implantado na Europa Ocidental no período pós-Segunda Guerra Mundial. Já se fala em corte de aposentadorias, em ampliação do tempo de trabalho para se tornar candidato ao sistema de aposentadoria, na ampliação da jornada de trabalho onde ela foi encurtada (na França a jornada semanal de trabalho tem 35 horas), na redução do período de férias remuneradas e na eliminação ou redução de outros benefícios conquistados pela classe trabalhadora.
         No momento, os números do desemprego assustam, especialmente entre os mais jovens. Na Espanha, a taxa de desemprego entre os jovens já alcança 50%; na França, este mesmo número já alcança 25%, a mesma taxa de desemprego da Grande Crise de 1929 nos EUA. Números tão negativos ou mais graves ocorrem em Portugal, na Grécia, na Itália ou na Irlanda.
         A explicação para todo este problema tem sua raiz na crise do mercado hipotecário dos EUA que foi uma decorrência da crise imobiliária pela qual passou o país em 2008, e deu origem, por sua vez, a uma crise mais ampla, no mercado de crédito global. O principal segmento afetado, que deu origem ao atual estado de coisas, foi o de hipotecas chamadas de "subprime", que embutiam um risco maior de inadimplência.
         Os bancos nos EUA que ofereciam contratos de crédito aos que desejavam um financiamento imobiliário repassavam esses títulos de crédito a outros bancos dentro e fora do país (inclusive europeus) os quais, por sua vez, repassavam a outros bancos e assim por diante.
         O surgimento e o crescimento da inadimplência dos devedores iniciais deu origem a uma reação em cadeia e banco após banco foi entrando na zona de risco com uma clara ameaça de quebradeira ameaçando todo o sistema.
         Foi para salvar os bancos que os governos europeus e americano usaram recursos do orçamento público, gerando o déficit atual.
         Ora, a redução do déficit orçamentário pode ser alcançada de duas formas: com a redução das despesas (a opção dos liberais) ou com o crescimento da economia (como propõe François Hollande).
         Nos mesmos moldes de François Mitterand, François Hollande vai enfrentar uma Europa apática e submissa a um modelo único. Curiosamente, nos dois casos, as mentoras dessa apatia e submissão foi uma e é a outra duas mulheres: Margareth Thatcher e Angela Merkel. Felizmente a História já mostra que as teses da Senhora Thatcher foram um fracasso.
         Resumindo a questão crucial. Hollande é minoritário numa Europa unificada e predominantemente liberal. Todavia, a escolha dos franceses é clara: chega de liberalismo. Chega de pensar no dinheiro antes de pensar nas pessoas! Que se danem os bancos!
        


Egito e Grécia: duas culturas e duas incertezas

Autoridades encarregadas das eleições no Egito ainda não tornaram público o percentual de votantes, mas a imprensa egípcia calcula que a parcela de votantes deve se aproximar de 50%, o que é um número muito baixo para um país que sai de um longo regime autocrático. Mais de 50 milhões de egípcios estavam aptos a votar no primeiro turno das eleições.
Após o fim da votação, as campanhas dos principais candidatos publicaram pesquisas de boca de urna, como é natural. Nessas pesquisas, o líder é Mohammed Mursi, presidente do Partido Liberdade e Justiça, braço político da Irmandade Muçulmana. Mohammed Mursi aparece com 28,2% dos votos e o ex-primeiro-ministro de Hosni Mubarak, Ahmed Shafiq, com 24%. Shafiq é encarado como opção para evitar que religiosos controlem o país e endureçam a legislação.
Esses números indicam que nenhum candidato terá mais de 50% dos votos válidos, o que levará à disputa de um segundo turno.
A possível vitória do candidato da Irmandade Muçulmana poderá levar ao cancelamento do tratado de paz entre Egito e Israel, uma vez que o mesmo “ofende a dignidade dos árabes e destrói os interesses do Egito e de outros estados árabes”. Este fato produzirá, certamente, um aumento do nível de tensões na região.
Por outro lado, a vitória do candidato do regime anterior trará pouca ou nenhuma alteração. Seguirá o Egito sendo um país subordinado aos interesses ocidentais, um país pobre e onde a corrupção viceja entre as elites.
Na Grécia, por sua vez, a questão é outra. O drama grego se situa em uma relação dívida/PIB (dívida total do país – pública + privada) próxima de140% e um déficit público da ordem de 8%. Do total desse déficit, somente 1,3% se relacionam ao déficit primário (receitas menos despesas). O restante  são juros e amortizações de empréstimos de grandes bancos internacionais que arriscaram, ganharam muito por algum tempo e não querem assumir que correram riscos como é o seu negócio. Os bancos arriscam e não admitem perder.
Esta falta de juízo se baseou na crença de que, ao fim das contas, a Grécia seria bancada pela União Européia ou pelo FMI. Mas não é bem assim. A um ganho maior corresponde um risco maior.
Como solução para a questão grega, o FMI, o Banco Central Europeu e os líderes políticos europeus mais influentes – Angela Merkel (Alemanha) e Nicolas Sarkozy (França) - receitaram a tal “austeridade” para a Grécia, como já o haviam feito para a Espanha, Portugal, Itália e outros.
Essa tal “austeridade” implica em corte de salários, redução de serviços públicos de educação, saúde, segurança e outros e, o que é pior, em mais desemprego. Por que não propor o caminho inverso, o do crescimento? Crescimento resulta aquecimento da economia,  em aumento da arrecadação de tributos, em desenvolvimento e em mais empregos. A explicação para a opção pela “austeridade” são os dogmáticos princípios neoliberais que já provaram sua ineficácia e inutilidade em outras praças.
A questão evoluiu para um outro ponto. Hoje se discute se a Grécia deve ou não permanecer na chamada “zona do Euro”. Ou melhor: hoje não interessa aos países líderes dessa “zona” que a Grécia saia dela. A saída da Grécia resultaria em um aumento da incerteza e da descrença na moeda européia, já que há, pelo menos, mais 4 ou 5 países caminhando pela beira do mesmo abismo por onde caminhou a Grécia. Fica uma questão a ser respondida: foi acertada a implantação de uma moeda  única em países com realidades sociais, econômicas, financeiras e cambiais tão diversas?
Há ainda a hipótese de que seja eleita, no próximo mês, uma coligação de esquerda autêntica para o governo grego. Neste caso, a tal “austeridade” seria inteiramente descartada, passando o governo grego a privilegiar as questões sociais em lugar dos interesses dos banqueiros. Neste caso, caberia à Grécia tomar a iniciativa de sair da “zona do Euro”.
Um fato, porém, é óbvio e certo: não pode o povo grego pagar pela ganância dos banqueiros e pelo descontrole governamental.