segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Capitalismo e feudalismo: mais semelhanças do que diferenças

É bastante claro o esforço que historiadores e economistas têm feito para diferenciar o feudalismo do capitalismo que o sucedeu. Confesso que tenho tentado encontrar essas diferenças, especialmente nos campos econômico e social. Até aqui, entretanto, o que tenho descoberto é que há muito poucas diferenças nas áreas econômica e social. Algumas características dos dois sistemas diferem somente na profundidade a que chegaram, permanecendo em essência as mesmas. A concentração da riqueza que temos hoje é talvez maior que a que havia no “ancien règime”; a miséria possivelmente é menor, mas é miséria.

         As características básicas do feudalismo eram o poder descentralizado (nas mãos dos senhores feudais), a economia baseada na agricultura com a utilização do trabalho dos servos. 

         O capitalismo atual, nomeadamente nos países da periferia do sistema, tem como principais traços também o poder descentralizado nas mãos de elites corporativas, financeiras, políticas e da mídia. A economia é mais diversificada, mas utiliza-se da força de trabalho de bilhões de empregados assalariados.

         Prevaleceram na Idade Média as relações de vassalagem e de senhorio. O senhor era quem emprestava um lote de terra ao vassalo, sendo que este último deveria ser fiel ao seu senhor, antes de tudo. O vassalo trabalhava para seu senhor, em troca de proteção e de um lugar no sistema de produção. As redes de vassalagem se estendiam por várias regiões, sendo o rei o senhor todo-poderoso.

         No panorama capitalista atual predominam as relações de subserviência dos empregados para com seus empregadores. É o empregador quem concede ao empregado uma vaga no mercado de trabalho em troca de sua mão de obra e fidelidade ao sistema de produção. Também hoje, as redes de submissão de empregados aos patrões se estendem por impérios empresariais corporativos e globalizados, sendo estes os controladores de tudo.

         No modelo feudal os poderes econômico, político e jurídico concentravam-se nas mãos dos senhores feudais, os donos dos feudos.

         No sistema capitalista atual, igualmente, esses poderes concentram-se nas mãos das corporações por meio de seus todo-poderosos acionistas controladores. Os poderes econômico e financeiro – obviamente – além do político e jurídico são exercidos em nome delas, já que são elas que controlam os fluxos de dinheiro, as indicações políticas e, muitas vezes, as decisões ou as omissões do poder judiciário.

         A sociedade feudal apresentava pouca mobilidade social e era altamente hierarquizada. A nobreza feudal – os senhores feudais, cavaleiros, condes, duques e viscondes - era a detentora de terras e arrecadava impostos dos camponeses. Os servos deveriam pagar várias taxas e tributos aos senhores feudais (o correspondente ao trabalho de 3 a 4 dias nas terras do senhor feudal), a talha (a metade da produção) e a banalidade (taxas pagas pela utilização do moinho e do forno do senhor feudal).

         O capitalismo que prevalece em nossos dias, sobretudo nos países da periferia do sistema também se caracteriza também pela baixa mobilidade social e por seu alto grau de hierarquização. A nobreza atual, a saber, os grandes empresários e controladores do capital de grandes corporações são os detentores dos meios de produção. Seus negócios, em escala internacional ou global, fundam-se na taxa de lucro maximizada pela venda de bens e serviços à população. Esse lucro exacerbado pode muito bem ser encarado como uma maciça transferência de riqueza dos pobres para os ricos. Este iníquo processo de transferência apenas amplia o fosso que separa as classes sociais no capitalismo, inviabilizando as demandas por justiça e igualdade. Não há “mão invisível” que possa interromper este perverso processo ou até eliminá-lo.
         No regime feudal, a educação era para poucos. Apenas os filhos da nobreza tinham acesso ao estudo, enquanto que a maioria absoluta da população era analfabeta e, por isso, não tinha acesso aos livros.

         No capitalismo de hoje ocorre algo muito próximo. As taxas de alfabetização das populações excluídas têm de fato crescido nas últimas décadas. Todavia, cria-se em torno delas um esquema maligno que anula esse avanço. Parcela ponderável dos alfabetizados recebe, através dos meios de comunicações de massa, diuturnamente incentivos para se afastarem dos livros e dos processos culturais. Processos de imbecilização brotam como ratos de esgoto da mídia nesses países. Como consequência desses processos, centenas de milhões dos considerados alfabetizados não passam de analfabetos funcionais, que são aqueles que reconhecem os sinais gráficos que formam um texto, mas são incapazes de reconhecerem o conteúdo deste mesmo texto.

         Assim, decorridos mais de cinco séculos, a maioria absoluta da população mundial permanece à margem do processo de inclusão. Tanto um sistema quanto o outro foram incapazes de produzir felicidade para a maioria. Temos alguma mudança se desenhando no horizonte? Certamente, não. Os poderosos de sempre não a permitiriam.

         Para agravar o quadro, as esquerdas em todo o mundo, a saber, os socialistas e mesmo os social-democratas, desistiram de prosseguir no processo de substituição do capitalismo por algo mais justo e igualitário. Optaram por humanizar o capitalismo. É trágico!

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