Neste ocaso da era dos combustíveis fósseis (carvão mineral, petróleo e gás natural) merece uma análise o que foi feito com toda a energia gerada a partir dessas fontes.
Nos séculos 18 e 19, as máquinas a vapor industriais e as locomotivas – a prosaica “maria-fumaça” – eram de uma ineficiência energética extremamente elevada. Antes de prosseguir, vale citar que eficiência ou rendimento de uma máquina é a relação entre a quantidade de energia que é cedida à máquina e a quantidade de energia (ou trabalho) que a máquina produz a partir da energia cedida. Ou seja, é o “quantum” de trabalho útil produzido pela máquina.
No caso das máquinas térmicas, a energia cedida provém do calor gerado na queima do combustível. As máquinas a vapor tinham um rendimento de, no máximo, 12% (88% da energia era desperdiçada). No fim do século 19, entraram em cena os motores a combustão interna que melhoraram um pouco o quadro, mas ainda assim o rendimento dos motores automotivos dificilmente alcança os 30% (mais de 70% da energia é jogada fora). A portentosa indústria automobilística, hoje globalizada, foi incapaz, ao longo de mais de um século, introduzir qualquer avanço tecnológico que reduzisse esse desperdício inconcebível e burro.
Nesta aurora do século 21, onde se vislumbram no horizonte próximo restrições ao uso de combustíveis fósseis, surgem como panacéias, como fontes de energia limpa, a produção de etanol (álcool etílico) e óleos vegetais a partir da biomassa (cana de açúcar, mandioca e milho e oleaginosas) para nos salvar a todos. O etanol seria usado nos motores dos veículos de passeio, enquanto os óleos vegetais seriam adicionados progressivamente ao óleo diesel para as máquinas e motores de maior porte.
Do ponto de vista ambiental, certamente haverá um ganho, dado que os combustíveis oriundos da biomassa retiram gás carbônico – o principal causador do efeito-estufa - da atmosfera, para realizar a fotossíntese da planta que os produziu. Todavia, do ponto vista energético a situação não será alterada. Os novos combustíveis vão ser empregados nas mesmas máquinas e motores que hoje queimam derivados de petróleo, mantendo-se o mesmo nível de desperdício de energia em vigor há mais de dois séculos.
Particularmente, no caso dos carros de passeio, o desperdício de energia é ainda mais acentuado. Experimente observar, nas principais cidades do Brasil e do mundo, de preferência na hora do “rush”, o número de automóveis presos nos congestionamentos e observe quantas pessoas estão dentro da maioria deles. No Rio de Janeiro, nas condições acima citadas, a média é de menos de 1,2 passageiros por automóvel. É isto mesmo, nossa civilização predatória desperdiçou e vai continuar a desperdiçar energia ao usar veículos que foram projetados para 4 ou 5 passageiros e que, no entanto, vão continuar transportando, em mais de 70% dos casos, apenas um passageiro.
Manda a inteligência que estes hábitos sejam reavaliados. Já que estamos no limiar de uma nova era, do ponto de vista do consumo de energia, por que não aproveitar a ocasião para uma tomada de consciência e para aquilatarmos se nosso modo de vida reflete um mínimo de inteligência em alguns aspectos cruciais, como por exemplo: por que não investir mais em programas e novas alternativas de transporte coletivo nas grandes e médias cidades? Que tal o transporte solidário? Por que tirar o carro da garagem apenas para ir a algumas quadras adiante de sua casa? Que mal há em caminhar essa distância rotineiramente? Que benefícios advirão desta mudança de hábitos? E as bicicletas? Que tal reativarmos esse salutar meio de locomoção para pequenas e médias distâncias?
A nossa resistência em cultivar esses hábitos não vai aumentar o aquecimento global, desde que estejamos utilizando fontes de energia renováveis. Entretanto, o desperdício de energia até aqui ignorado por nossa civilização de consumo vai forçar a ampliação da área a ser cultivada com vegetais produtores de energia e a conseqüente redução da área destinada ao cultivo de alimentos.
Argemiro Pertence
( apertence@yahoo.com.br )
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