sábado, 17 de maio de 2008

O ídolo com pés de barro

Nossa sociedade de consumo erigiu um altar ao automóvel e fez dele seu maior sonho de consumo. O automóvel deixou de ser uma utilidade para vencer as distâncias e passou a ser objeto de desejo, especialmente das classes médias. Vítima da propaganda que associa ter um carro ao sucesso na vida, o consumidor dedica boa parte de seus esforços para incorporar a seu patrimônio um automóvel, mesmo que usado. Depois descobre que a prometida liberdade de ir e vir é em muito limitada pelo excesso desses veículos nas ruas de nossas metrópoles e conclui conformada que há mais carros nas ruas do que espaço para sua circulação.

O que também não é dito ao consumidor é que o automóvel moderno é u’a máquina retrógrada, defasada e ineficiente, envolvida por uma carroceria em que predominam alguns itens de conforto e segurança que objetivam mascarar o fracasso tecnológico escondido sob a tampa do compartimento do motor.

Seu motor é um exemplo perfeito de ineficiência energética ou de “desengenharia” (perdoem o neologismo). O motor dos carros de hoje incorporou, em mais de um século, muito pouco ou quase nada no que afeta o seu rendimento mecânico. O rendimento de qualquer máquina é a relação entre a energia tornada disponível e a energia de fato usada para produzir trabalho. Nas máquinas térmicas, como os motores dos carros, podemos calcular a energia tornada disponível a partir do calor liberado pela queima do combustível Contudo, uma grande parte desta energia se perde como calor para o meio ambiente e por atrito. Apenas para se ter uma idéia, o rendimento dos motores a gasolina, álcool ou gás natural varia na faixa de 24 a 28%! Ou seja, um motor de automóvel desperdiça ou joga fora entre 72 e 76% da energia liberada pela queima do combustível. Se um litro de gasolina custa hoje algo como R$ 2,50, a cada litro consumido R$ 1,80 são gastos inutilmente. Vamos a um exemplo real: se um veículo consome, em média, 1 litro de gasolina a cada 12 quilômetros percorridos, numa viagem entre Rio e São Paulo – cerca de 400 km – um carro consumirá 34 litros a um custo total de R$ 85,00. Desse total, R$ 64,00 serão gastos inutilmente, em função da ineficiência dos motores..

O rendimento dos motores diesel é maior que o dos motores a gasolina porque o diesel é queimado numa temperatura superior. Portanto, uma parte maior do calor pode ser empregada para produzir trabalho útil. Na média, o rendimento dos motores diesel dos caminhões, locomotivas ferroviárias e fábricas fica na faixa de 32 a 38%.

Poderíamos pensar que o motor a jato dos modernos aviões, que funciona em tão altas temperaturas e possui poucas partes móveis, tem um alto rendimento, mas isto não é verdade. O motor a jato libera gases de combustão a temperaturas muito altas, o que acarreta uma grande perda de calor e, portanto, energia. Seu rendimento é equivalente ao dos motores a gasolina, isto é, cerca de 24 a 28%.

No mundo de hoje já há motores capazes de levar um artefato espacial aos confins do Sistema Solar ou mesmo além. A partir desses dados, soa estarrecedor que, num mundo de tantos avanços tecnológicos em tantos segmentos, a indústria automobilística tenha se provado tão indolente, defasada e incompetente para produzir motores mais alinhados com o atual estágio de demanda de nossa civilização

Finalmente, lembre-se sempre: ao ligar o motor de seu carro, você estará acionando uma das máquinas mais burras em uso ainda hoje. E mais, neste momento, você estará desperdiçando R$ 75,00 em cada R$ 100,00 gastos em combustível.

Um comentário:

RoqueT disse...

Sim, Peretence. Em parte e verdade. Mas acho que o importante sao os porques!
Em parte porque acho que o que v. escreveu, omitiu que as grandes
corporacoes e governos praticam a cumplicidade, visando sempre aumentar
seus lucros especulativos.
Porisso as corporacoes automotivas andam de braco dado com os donos do
petroleo, na maioria das vezes, os governos.
A engenharia automotiva cria, a medida do necessario! Ou seja, criou o
motor a combustao interna, o diesel, o rotativo (lembra do velho alemao
Henkel?), o eletrico, o a hidrogenio ou celular, etc... So que cresceu mais
devagar, por depender de muito investimento, engenharia, materiais,
etc...do que a producao de petroleo, por exemplo.
Desta forma, a pressao para se ter mais carros sempre foi maior do que para
se "criar" alternativas de motorizacao, principalmente as que nao usassem
oleo.
Mesma coisa pra carrocerias, que tiveram pouca evolucao e ainda pesam cerca
de 900kg em chapa de aco (ja foram 2200kg!), e levam derca de 4900 pontos
de solda ...da mesma forma que ha 50 anos atras.
Pelo menos, nao soldamos mais com chumbo, estanho com macarico e arco
eletrico. A pressao dos carteis do aco, e maior do que as dos
produtores de plasticos...da muito problema de ambiente, reciclagem,
durabilidade, cor, cheiro, etc....que requer mais engenharia, a maior
custo....Alem disso, e so lembrar que GM deu com os burros n'agua, quando
lancou a Saturno, sua divisao manufatureira de veiculos comuns com paineis
externos de plastico....que nao pegou, foi mico e amargamos prejuizos
homericos, desde 1988. So a Corvette sobrevive com carroceria de plastico,
porem a baixos volumes e preco elevado!
Portanto, os carros hoje como sao, com motores ineficientes, "de engenharia
atrasada" como v. descreve ..., sao resultado da epoca, dos interesses
e dos carteis que manipulam o gosto dos consumidores.
Porque haveriam os motores de ser atomicos? Energia estelar pra
cobrir percursos medios diarios de 60 km?
Porque haveriam de ser todos eletricos? A producao de energia nao
estaria igualmente afetada por recursos limitantes e de natureza
ecologica (reciclagem de baterias, duracao de cargas, materiais,
etc...)?
Poderiam ser todos diesel? Talvez sim, se prevalecer o fator
rendimento do motor...mas ainda limitado ao desenvolvimento de
materiais e peso de carrocerias....

Por que sera que nos EUA ainda nao tem alcool em mais de 90% da frota, como
no Brasil ha muito tempo? Sera porque o governo nao consegue vencer o
cartel dos petroleiros?...sera que teriam invadido o Iraque, por exemplo?
Ou sera porque o a constituicao americana proibe o governo de ter uma
estatal que controle o preco e distribuicao do alcool?

Enfim, colega, em festa de porco-espinho nao tem bexigas! Como dizia meu
querido pai!

Como ve, nao e um problema de capacidade das engenharias, mas sim
possibilidades ou querencias, como dizem os amigos baianos!

De um amigo paulista
na terra do tio Sam, do ramo automotivo.

RoqueT